Fazia muito tempo que um filme não me proporcionava uma flutuação tão entre sentimentos tão antagônicos e em tão pouco tempo. Ao longo das poucos mais de 2 horas de duração de Um Olhar do Paraíso eu transitei entre alegria, tristeza, raiva, ânimo, excitação, discórdia, admiração, repulsa e acabei no desapontamento com um final simplesmente horrível. Um Olhar do Paraíso tem um bom elenco, um diretor que nem é tudo isso não, porém tem boas características, uma história que possui alguns elementos interessantes, e um monte, mais um monte mesmo de excessos de borrões e fantasias mal construídas e mal encaixadas, aproveitando uma fotografia maravilhosa e uma imaginação para elementos místicos do diretor Peter Jackson, que vão se arrastando, em meio a uma ou outra coisa aceitável, até desembocarem aonde tinha que desembocar, ou seja, em um filme bobo, vazio e que se tivesse seguido o caminho certo, poderia ter sido um filmaço.
O roteiro tem dois elementos interessantíssimos, que poderiam ter ajudado um pouco o filme se melhor explorados, sendo o primeiro a questão de até onde o desejo humano pode influenciar nas coisas e a segunda, é uma virada de um preconceito, já que quando as coisas apertam na família, a mãe foge e é o pai quem segura a barra, entretanto, este segundo me parece uma tendência atual, já encontrada de forma mais leve em Traídos Pelo Destino, filme do diretor Terry George e de forma bem poderosa em A Estrada do diretor John Hillcoat. Todavia, eu não vou dedicar mais palavras a estes temas, por um simples motivo: o filme não liga pra eles, mas os coloca de lado, reduzindo-os a frases banais que se alternam em crises existenciais e momentos auto-ajuda que não convencem nem criança.
A história então é simples: menina de 14 anos desaparece e o filme acompanha então duas odisseias: a do pai e da família de certo modo em descobrir o assassino, e a da menina assassinada, que se encontra em uma espécie de limbo, e acompanha (e em alguns momentos até interfere) nas ações de seus familiares e amigos.O filme tem tudo; psicopata com cara de bobão, brigas de família, misticismo, elementos religiosos cristãos e não-cristãos, cenas de terror, até a velha obsessão dos americanos por milharais e os perigos que eles escondem volta aqui, porém, falta uma ligação, falta um elo forte que ligue de forma consistente todos estes elementos.
O roteiro é um buraco só. Ele até que começa bem, mas se perde no momento em que a menina morre e Peter Jackson começa a brincar de formar arco-íris. Se a fita focasse mais em lembranças e na tentativa de encontrar o assassino da filha por parte do pai da menina, por mais que se tornasse um mais do mesmo, facilmente seria um filme melhorzinho. Peter Jackson é um diretor que gosta de coisas grandes, exageradas e tem uma mão muito pesada, para uma história que de certo modo é leve. Existem cenas deste limbo onde a menina se encontra que parecem tiradas dos Teletubbies, outras que lembram muito aquele filme com o Robin Williams chamado Amor Além da Vida, outras ainda que me fizeram resgatar da memória um filme do Terry Gilliam chamado Contraponto e que por mais bonitas que sejam, soam deslocadas, exageradas e o pior desnecessárias, e que atendem apenas a esta obsessão megalomaníaca que Jackson tem pela fantasia e por coisas extraordinárias (no sentido absurdo da palavra mesmo). Como se já não bastasse, o final consegue piorar a coisa, deixando nítido o fato de que história mesmo nós tínhamos até a morte da menina, depois disso apenas devaneios e navegações voluptuosas e frívolas de Peter Jackson, ou seja, enrolação mesmo.
O elenco reflete o exagero de Jackson, principalmente Mark Wahlberg e Susan Sarandon. Rachel Weisz está perdida no papel, e em vários momentos não sabe o dom certo de sua ação. Stanley Tucci constrói um psicopata clássico e Saoirse Ronan usa e abusa de uma liberdade que Jackson não deveria ter lhe dado, já que o resultado foi uma atuação viciosa e que força o espectador o tempo todo, convencendo alguns, porém outros (como eu) não.
Em meio a este misto de religiosidade, acasos e epifanias, que alguém resolveu nomear de roteiro, salva-se apenas a boa atuação da menina Rose Mclver como a irmã da protagonista, uma ou outra cena bem construída (como a das páginas sendo viradas pela personagem de Mclver de um caderno em que o psicopata relata seus planos, enquanto o mesmo sobe as escadas em direção ao seu quarto invadido pela mesma personagem acima citada), e uma cenografia e fotografia, aliada aos efeitos especiais que criam cenas belíssimas, porém parnasianas e que servem apenas como contemplação e não como alicerce para a apreciação de um filme que pede para não ser apreciado.
Podia ter dado certo, já que possui elementos para tal, mas a presença de Jackson, desviou o filme para um dos poucos caminhos que o levariam a ruína, e o resultado não poderia ser outro, um filme chato, que gera no espectador diversas sensações, em alguns momentos boas, porém predominantemente ruins, e é isto o que levamos quando a fita termina, ratificado por um dos piores finais que eu vi nos últimos tempos. Com um livro como o de Tolkien e uma grana enorme daquelas não é muito difícil fazer O Senhor dos Anéis, ou seja, Jackson ainda está devendo muito, ainda mais quando o assunto é chegar ao nível em que alguns exagerados já o colocam.
(The Lovely Bones, 2009 de Peter Jackson)
NOTA: 3,5
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