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quinta-feira, 19 de setembro de 2013

RUSH - NO LIMITE DA EMOÇÃO


A F-1 ou o automobilismo em geral nunca foram temas de grande inspiração para os diretores e produtores da sétima arte. Eu até gosto de Grand Prix e admito a excelência técnica do mesmo, mas com certeza faltava aquele algo a mais. O algo a mais que poderia atrair para um filme sobre F-1 aquele que não é um amante assíduo do esporte. Aquele algo a mais que conseguiria mostrar ao espectador leigo que a F-1 é muito mais do que um simples “conjunto de carros que ficam dando voltas sem parar pelo mesmo lugar”. Eis então que surge Rush e consegue tal façanha com louvor.

A rivalidade entre James Hunt e Niki Lauda sempre foi uma das mais presentes e fortes em toda a história da F-1 e com certeza, a temporada de 1976 foi o auge desta rivalidade. Não sou um saudosista quando se trata de F-1, não obstante, ainda acompanho todas as corridas de todas as temporadas com muito entusiasmo. Gosto da era “romântica” tanto quanto da atual, e devido a minha idade, entendo bem mais da segunda do que da primeira. Contudo, é impossível não aceitar a ideia de que em 1976 o risco do esporte era muito maior do que em 2013, fazendo com que tudo fosse um pouco mais cru e um pouco mais assustador.

O diretor Ron Howard, que é capaz de grandes filmes como Uma Mente Brilahnte; Frost/Nixon; Apollo 13 e ao mesmo tempo capaz de bombas como Anjos e Demônios faz um trabalho incrível aqui, sempre acompanhado pelo aguçado roteiro de Peter Morgan. As cenas de corridas são incríveis e Howard se utiliza de uma câmera baixa para garantir toda a emoção possível ao espectador através de imagens aproximadas e o som característico dos motores dos carros. Em alguns momentos, Howard dramatiza demais e abusa de tomadas mais longas, mas nada que prejudique o trabalho final. Ao apostar em dividir a tela entre dois pilotos, unidos por uma paixão, separados por concepções de caráter e de conduta e marcados por uma época, Howard consegue equilibrar os momentos dentro da pista com a vida dos dois fora das pistas, e conjugar corretamente os reflexos causados mutuamente e reciprocamente por todos estes elementos. Hunt e Lauda foram grandes por tudo aquilo que os envolvia, e a rivalidade entre os dois só foi o que foi devido ao choque destas duas grandezas. Captar, aceitar e respeitar isto, sem tomar partido em nenhum momento ao longo da fita, foi com certeza o grande mérito de Howard.

O elenco foi escolhido de forma muito interessante. Chris Hemsworth é praticamente uma versão atual de James Hunt, tanto fisicamente, quanto no seu jeito canastrão; o que facilitou o bom desempenho do ator conhecido por seu trabalho em Thor. Todavia, o destaque mesmo vai para Daniel Brühl. O ator hispano-germânico conhecido por seu trabalho em Bastardos Inglórios e o sensacional Adeus, Lênin encarna de forma perfeita o vivo Niki Lauda, reproduzindo seus trejeitos, suas manias, seu sotaque e até a entonação de voz.

Por mais incrível que possa parecer, Rush é um filme vibrante, impressionante e que consegue transitar muito bem na tênue linha que separa o público leigo e os amantes de F-1, agradando assim a gregos e troianos. O exemplo claro disso é que fui ao cinema acompanhado de minha esposa, que inversa a mim, não possui nenhum apreço pelo esporte, mas saiu igualmente entusiasmada com o filme. Howard parece ter criado aqui, um daqueles filmes que se tornarão padrão para os possíveis filmes vindouros sobre a categoria, o que é muito bom afinal Rush é um grande filme para todos os públicos e para os amantes da F-1 é o que há de melhor até o momento. Para aqueles, que assim como eu, alimentam uma grande paixão tanto pelo cinema quanto pela F-1, Rush é um exercício de êxtase e até o momento o melhor representante já produzido por esta união. A orfandade acabou.


(Rush de Ron Howard, EUA/Alemanha/Reino Unido - 2013)



NOTA: 9,5

domingo, 25 de agosto de 2013

UM GOLPE PERFEITO


Um forte elenco, com roteiro clássico de filmes de golpes e com a envergadura da assinatura dos irmãos Coen, Um Golpe Perfeito tenta se sustentar com base em elementos básicos da comédia de cunho mais “inglesa” (mesmo sendo um filme de nacionalidade americana), ou seja, piadas de duplo sentido que transitam entre o sutil e o explícito, maneirismos pessoais e construídos na base dos atores, bordões formatados através de temas mais cultos (no caso aqui, o mundo dos compradores e colecionadores de arte), e lógico que não poderia faltar também aquele dose fatal de crítica a alguma parte dos EUA (no caso aqui o Texas).

O filme é dirigido por Michael Hoffman, diretor instável e dono de vários filmes “legaizinhos”, entre eles, podemos citar O Outro Lado da Nobreza, Sonhos de uma Noite de Verão, O Clube do Imperador e o recente A Última Estação. Hoffman tem dificuldades com o andamento do filme em alguns momentos e acaba se jogando em situações um pouco exageradas, algo que se potencializa com o roteiro cheio de excentricidades dos Coen.

Os personagens são extremamente caricaturais, o que pode irritar algumas pessoas em alguns momentos (a personagem de Cameron Diaz em alguns momentos só falta mugir para encarnar o aspecto texano exagerado de sua personagem) e Hoffman desaba suas tomadas rápidas em cima destas caricaturas. Já vi Colin Firth e Alan Rickman fazerem personagens parecidos com mais elegância e classe, mas é inegável que ambos seguram as pontas de forma muito precisa, com a competência que sempre se espera de atores do quilate de ambos.

Intercalando cenas muito engraçadas (como as de Colin Firth na recepção ou pulando nos quartos do hotel Savoy) com momentos não tão inspiradores (como a abordagem clichê à personagem de Cameron Diaz), Um golpe perfeito se coloca como mais um instável trabalho na carreira de Hoffman. Vale uma conferida pelo elenco, pela acidez habitual das comedias "inglesas" que se mostra presente e pelo interessante desfecho que conseguiu fugir de um final que se desenhava claramente preguiçoso.


(Gambit de Michael Hoffman, EUA - 2012)


NOTA: 6,0

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

A PARTE DOS ANJOS

      
Quando soube no ano passado do lançamento de A Parte dos Anjos, o novo filme de Ken Loach, fiquei bem animado, afinal minha admiração pelo cinema do diretor é muito grande e a cada novo filme seu já brota em mim aquela curiosidade característica dos cinéfilos. Minha animação só aumentou quando A Parte dos Anjos venceu o Prêmio do Júri do Festival de Cannes no ano passado, contudo tal animação vinha sempre carregada por uma tristeza latente: a de que dificilmente eu conseguiria ter acesso ao filme pelas telas do cinema e até mesmo em DVD. Todavia, coisas estranhas acontecem, e com uma surpresa enorme, descobri que a nova aventura de Ken Loach estrearia em uma sala de um dos cinemas londrinenses (isso há algum tempo atrás). Assim sendo, não perdi a chance e me dirigi ao local gerador de minha surpresa.

Surpresa esta que não existiu ao longo dos pouco mais de noventa minutos da obra à qual dediquei este meu tempo. Conhecido por seu engajamento esquerdista e por suas críticas a um enquadramento social desigual e que gera desfavorecimentos de algumas classes em detrimento de outras, o cineasta britânico se utiliza de uma sombria Glasgow para contar a história de Robbie, um “jovem delinqüente” que é condenado a cumprir trezentas horas de trabalhos comunitários. Neste trabalho ele conhece Harry, um apreciador de uísques que presta auxílio ao garoto e o faz descobrir um talento natural para a percepção desta nobre e apreciada bebida. A partir deste ideia o filme se desdobra em uma leve comédia social com toques dramáticos.

Qualquer pessoa que tenha tido contato com a obra de Loach, perceberá que em A Parte dos Anjos  o diretor aposta mais no humor do que no drama engajado propriamente dito, algo já visto de forma bem mais sutil em À Procura de Eric. Porém, neste último, o elemento dramático ainda permanece e o humor aparece como refúgio dos personagens. Em A Parte dos Anjos o humor é mais central e se apóia nos dramas dos personagens para se firmar. Jamais imaginei que soltaria grandes risadas em um filme de Ken Loach, mas é o que acontece aqui (principalmente com o personagem Albert, o abobalhado e atrapalhado amigo de Robbie). O humor é preciso, e consegue se colocar por sua própria força, além de não atrapalhar a mensagem “oculta” que o filme carrega, ou seja, a de uma juventude forçada e coisas “ruins” por uma sociedade injusta, desigual e hipócrita. O engajamento social, econômico e cultural e sua necessária crítica continuam presentes aqui, só que ao invés de mostrado de forma dramática como normalmente faz, Loach opta por um humor correto e pouco comum em seus filmes, mas que funciona muito bem. Para um cineasta com quase 50 anos de carreira, conseguir alterar a forma sem mudar o conteúdo é quase uma proeza, ainda mais em um mundo preguiçoso como o de hoje.


A Parte dos Anjos pode até não ter causado em mim uma reação tão grande quanto os meus filmes favoritos do diretor (Kes, Meu Nome é Joe e o brilhante Ventos da Liberdade), mas já se mostra como um dos meus filmes favoritos de 2013. Imperdível.


(The Angel´s Share de Ken Loach, Reino Unido/França/Bélgica/Itália - 2013)


NOTA: 9,0

segunda-feira, 23 de julho de 2012

A LULA E A BALEIA



Representante firme e claro do cinema independente que possui sua base em um roteiro curto, polido e forte para retratar e destrinchar a organização e as relações familiares envolvendo seus protagonistas em uma teia de dramas, descobertas e revelações, sejam em caráter pessoal ou no âmbito geral do cenário.

Dirigido e roteirizado por Noah Baumbach, A Lula e a Baleia retrata os dias pré e pós separação de um casal formado por um escritor em crise e uma nova escritora que começa a fazer sucesso. Envolvidos neste meio estão os dois filhos do casal, onde um começa a descobrir namoros e problemas e o outro começa a descobrir seu próprio corpo e sua sexualização.

 Após a separação dos pais é que o filme começa a ganhar o corpo e seus contornos mais claros. A dúvida, o sucesso, o fracasso e principalmente sensações de ter podido fazer algo mais, ajudado mais ou menos e coisas assim começam a atormentar a vida destes quatro membros da família, ao mesmo tempo em que tentam seguir suas vidas. O roteiro de Baumbach acerta a mão, ao conseguir dosar muito bem os momentos dramáticos, com alguns momentos de humor ácido sem perder em nenhum momento o respeito pelo material ou pelo espectador. Cenas mais duras ou até mesmo mais incisivas conseguem sem manter sem qualquer elemento apelativo e não se mostra distante do escopo geral ou mesmo uma manobra de resolução fácil. Além disso, o roteiro faz várias alusões a clássicos da literatura, inclusive utilizando-os como exemplo e colocando-os como norte para as decisões dos personagens em alguns momentos, sejam elas diretas ou apenas indiretas, em uma mensagem muito mais do roteiro em si do que de algum personagem. Entre os vários dramas que assolam os personagens, destaque para as enganações que o personagem Walt (o filho mais velho interpretado por Jesse Eisenberg) se impõe, seja com um infeliz namoro, um pseudo intelectualismo ou usurpar composições (no caso Hey You do Pink Floyd).

Este tipo de filme exige um elenco afiado e que compre além da ideia central, a ideia individual de seus personagens, com suas idiossincrasias e moralismos, e nesse ponto a coisa consegue funcionar novamente com algumas ressalvas. Jeff Daniels e Laura Linney como o casal central mostram a falta de química necessária para o espectador aceitar a separação, porém se tornam muito chatos quando resolvem atuar sozinhos, se é algo proposital de Baumbach deu certo, caso contrário... Jesse Eisenberg firma muito bem seu personagem, porém a cada dia que passa me parece que ele só consegue interpretar este tipo de personagem. Owen Kline se situa muito bem como o filho mais novo, e mesmo tendo cenas complicadas a fazer, se mostra desinibido e bem coerente em sua atuação. Anna Paquin está ótima como a aluna do personagem de Daniels que se torna sua namorada, contudo não supera o ótimo William Baldwin no auge da caricatura para construir o professor de tênis que se torna namorado da personagem de Linney.



É um filme interessante, bem construído e que apenas esbarra em alguns momentos na sua própria falta de ambição. É inevitável a sensação de que Baumbach poderia ter explorado melhor os simbolismos do filme, assim como suas relações, mas não vamos prejudicar tudo por causa de um detalhe como este também.





(The Squid and The Whale de Noah Baumbach, EUA- 2005)



NOTA: 7,5

terça-feira, 10 de julho de 2012

ROBOCOP



Robocop é ainda hoje um dos mais famosos personagens da história do cinema, um dos filmes mais adorados pelos fãs ortodoxos dos anos 80 e um fenômeno cinematográfico dos mais intrigantes. A história do policial Alex Murphy que após ser fuzilado por um grupo de bandidos encontra-se em estado de morte certa e é transformado em um cyborg para trabalhar ao lado da polícia de Detroit encontra-se no hall absoluto dos cults eternos.

Dirigido pelo instável diretor holandês Paul Verhoeven, a saga de Robocop é um misto de drama, ação e ficção, que mistura desde perseguições em grandes velocidades e armas de fogo pesadíssimas a dramas existenciais rasteiros e a psicologismos furados e muitas vezes irritantes. Enquanto se concentra no primeiro ponto, Robocop é realmente um filme bom e interessante, contudo quando resolve se aventurar no segundo aspecto se torna simplesmente sofrível.

Os problemas do filme vão desde efeitos especiais na linha de Jaspion e de outros tokusatsus e sentais japoneses (que funcionavam nos anos 80, mas envelheceram e necessitam de uma enorme boa vontade do espectador para impressionar) até atuações sofríveis como a de Nancy Allen no papel do policial Lewis que é parceira de Murphy  (e lembra muito a Maggie Gyllenhaal). A trilha sonora é quase uma cópia de outras ficções de elementos futuristas e cheias de sintetizadores e o roteiro possui lacunas simplesmente incompreensíveis, incluindo um de seus nortes centrais, que é a permanência da memória de Murphy após ser transformado em cyborg ou a própria sobrevivência do mesmo. O filme não deixa claro em nenhum momento se Murphy morreu ou não, ou seja, Robocop é uma transformação ou uma ressurreição, mesmo que em forma diferente? Todas as respostas que eu ouvi até agora me parecem insatisfatórias, e após muitos anos, assistindo ao filme novamente não encontrei a resposta.

Como pontos positivos temos a mixagem de som perfeita, aliada ao figurino bem construído e muito característico do personagem que, para o bem ou para o mal, criou um ícone do cinema e a direção bem dosada e firme de Verhoeven. As cenas de ação são extremamente bem feitas, e mesmo nos momentos “drama” do filme, Verhoeven consegue não prejudicar ainda mais, em outras palavras, o diretor holandês conseguiu perceber os pontos fortes do roteiro e os potencializou, tentando ao máximo diminuir o constrangimento de cenas desnecessárias e muitas vezes fora de contexto.

Eu gostava mais do filme nos anos 90, quando ainda era mais jovem e não tinha tanta bagagem em minha vida cinematográfica. Robocop envelheceu em vários aspectos, porém continua firme e forte na mente dos nostálgicos fãs dos anos 80. Efeitos especiais toscos por efeitos especiais toscos eu ainda prefiro Jaspion e afins, mas não posso negar que o Policial do Futuro ainda possui seu lugar em minha mente. No final das contas, a nostalgia e as lembranças de criança superam a chatice de uma crítica adulta.


(Robocop de Paul Verhoeven, EUA - 1987)



NOTA: 7,0

domingo, 1 de julho de 2012

SOMBRAS DA NOITE



Dizer que a parceria Tim Burton e Johnny Depp é uma das mais famosas da história do cinema é chover no molhado. Mais ainda é afirmar que a parceria produziu grandes filmes como Ed Wood, Edward Mãos de Tesoura e A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça, mas também produziu um desastre como A Fantástica Fábrica de Chocolate e o chato Alice no País das Maravilhas. De tal forma, analisar Sombras da Noite é realizar um exercido tanto de esforço como de gosto, seja qual for o ângulo sob o qual você programar sua visão sobre a obra.

Johnny Depp encarna Barnabas Collins, um homem de uma família inglesa que vem para o Maine nos EUA fazer fortuna no ramo da pesca. Ao se envolver com uma bruxa que ele depois renega, é transformado por esta em um vampiro e enterrado em um caixão por duzentos anos, despertando apenas no ano de 1972.

A ideia central em si já possui uma deixa sensacional para um grande filme, que é o choque de culturas. Um personagem do século XVIII que de repente aparece no século XX é um prato cheio para piadas, boas histórias, dramas e aventuras. Tim Burton consegue perceber este elemento e constrói as melhores e mais engraçadas cenas de sua obra exatamente em cima deste elemento (basta ver a cena em que Barnabas conversa com os hippies ou a cena em que ele pede conselhos amorosos à adolescente interpretada por Chloë Moretz), contudo, é inevitável notar que no momento em que o mesmo abandona tal temática o filme perde um pouco de seu ritmo, e se torna meio maçante.

O clima dark/gótico característico das obras de Burton está novamente presente aqui e com força total, algo que funciona bem, mas que neste filme, devido à temática, funciona até melhor que o normal. O roteiro possui algumas falhas de construção e de andamento, fazendo com que Sombras da Noite tenha grandes momentos intercalados com partes bem fastidiosas. No quesito direção, Burton novamente segue seu estilo, ou seja, atores muito bem focados e guiados, andando por situações muitas vezes vacilantes. Burton é um grande visionário e um grande linguista de cinema e não um grande diretor.

Refletindo na totalidade a alternância de seu ritmo, de seu roteiro e de sua direção, Sombras da Noite intercala uma direção de arte e uma fotografia vibrantes, um figurino excelente, porém uma maquiagem de gosto duvidoso. A trilha sonora possui poucos bons momentos, mas no geral é fraca e barulhenta.

O elenco é recheado de nomes conhecidos e inclui pequenas participações de lendas como Christopher Lee e Alice Cooper. Johnny Depp está ótimo no personagem, e, para minha satisfação, não recuperou as “macaquices” e trejeitos de seu Jack Sparrow. Eva Green, que já é por si só uma grande atriz, constrói uma personagem excelente, que domina boa parte do filme para cair em um desfecho lamentável. Bella Heathcothe também se destaca com sua misteriosa interpretação do terno amor de Barnabas; enquanto que Michelle Pfeiffer e Jackie Earle Haley também estão ótimos. Como destaque negativo, não tanto pela atuação, mas pela personagem, temos Chloë Moretz que sofre para se adaptar a uma personagem caricata, mal construída e que só está ali para funções de estereótipos familiares e para cumprir o papel de ser o lobisomem da vez em uma história de vampiro (nova necessidade deste tipo de filme, e que se mostra cada vez mais ridícula).

Sombras da Noite é um filme leve, muitas vezes despretensioso e que nos mostra um Tim Burton menos ambicioso. Se em vários momentos ele nos diverte, em outro ele nos leva a sensações menos interessantes, contudo não é um filme ruim, apesar de seu final preguiçoso e totalmente sem explosão. 


(Dark Shadows de Tim Burton, EUA - 2012)



NOTA: 6,5

terça-feira, 19 de junho de 2012

CORIOLANO



Estréia de Ralph Fiennes na cadeira de direção, Coriolano adapta e transporta para a atualidade mais uma obra de Shakespeare. Assim como o desafio de se fazer tal ruptura não é algo novo, os problemas e os acertos de tal audácia continuam também os mesmos.

Assim como Baz Luhrmann em seu ótimo Romeu + Julieta e Michael Almereyda  em seu não tão ótimo Hamlet – Vingança e Tragédia, Fiennes opta por manter a linguagem clássica e erudita de Shakespeare, algo que já de início choca, ainda mais aqui, onde as cenas iniciais são de guerra constante. Esta manutenção da linguagem erudita, por mais que agrade pessoas de ouvidos abertos às nuances e belezas da língua, atrapalha na assimilação da ideia geral e do contexto mais coloquial devido ao excesso de metáforas e elementos poéticos, em outras palavras, como não estamos diante de um filme de época, onde o espectador já espera tal erudição lingüística, o negócio soa meio artificial e deslocado. No filme de Luhrmann acima citado, o aspecto romântico da fita segura esta artificialidade em baixa devido à poesia do próprio romance. Já no caso de Almereyda, a artificialidade é mais evidente, porém disfarçada também pela majestoso ambiente que a melhor peça de Shakespeare propõe. Todavia, Fiennes se vê de encontro com uma história totalmente trágica, com elementos políticos e diplomáticos que funcionavam na Roma Antiga, mas que atualmente não funcionam mais.

Banimento da cidade, patrícios, plebeus não condizem com o meio atual e deixa o espectador meio desconfortável quanto ao real sentido de tudo aquilo. O desenrolar é simples, e em alguns momentos as coisas se resolvem muito fáceis, enquanto que em outros o negócio rasteja. O início é muito lento e tedioso, e provoca uma correria no final, onde muitas coisas são atropeladas. Fiennes acaba perdendo um pouco a mão neste sentido, e não consegue um bom equilíbrio do enredo, onde temos um início extremamente maçante, uma meio empolgante e forte e um final corrido e com desfecho mal trabalhado.

Tirando estes elementos, e o fato de o filme se perder um pouco nos “romanismos” que a peça possui, Coriolano caminha até bem. Fiennes tem uma atuação incrível como Caio Márcio e Vanessa Redgrave encarna com muita força a mãe do personagem central. Mesmo Gerard Butler cuja qualidade da atuação nunca supera seu carisma é conduzido de maneira segura por Fiennes. Por sua vez, Jessica Chastain, o novo arroz de festa do cinema, está um pouco apagada em um papel de pouca relevância como a esposa devota do General Caio Márcio.

O trabalho é ousado e Fiennes pagou um pouco pela ousadia. Talvez um diretor mais experiente conduzisse melhor tal obra, entretanto, o início é sempre complicado, e Fiennes parece ter talento para a nova função que se propôs a assumir. Seu trabalho no final das contas é caracterizado por uma boa direção dos atores, mas por uma má distribuição do roteiro e por problemas de andamento. Logicamente, o ator que já nos propiciou grandes atuações em A Lista de Schindler, O Morro dos Ventos Uivantes, o Paciente Inglês e é conhecido do grande público por ter encarnado o maléfico Lorde Voldemort na saga Harry Potter terá muito a evoluir na função de diretor, contudo, parece ter talento e perspicácia, algo que nos leva a acreditar que no futuro filmes melhore virão. Coriolano não chega a ser um filme ruim, mas falta um algo a mais para elevá-lo às categorias áureas do cinema, e é exatamente este algo a mais que Fiennes terá que aprender.


(Coriolanus de Ralph Fiennes, Inglaterra - 2011)


NOTA: 5,5

sábado, 16 de junho de 2012

A FRONTEIRA



Produção franco-suíça, A Fronteira é um dos mais famosos representantes do cinema de horror moderno europeu, e sendo assim, faz parte desta tentativa do velho continente em retomar e, de certo modo, se tornar um potência neste gênero tão apreciado, mas que sempre foi um pouco esquecido por várias escolas européias. 

Partindo de um argumento não muito original, mas que ainda funciona, A Fronteira mistura sustos, com cenas fortes, extrema sanguinolência e opta pela bestialidade humana ao invés do elemento sobrenatural. Assim, elementos clássicos do terror não-sobrenatural como endogamia, canibalismo, mortes violentas, deformações, sadismo entre outros; percorrem os pouco mais de noventa minutos deste trabalho.

Um grupo de amigos parte da França em direção à Holanda para ajudar uma amiga a realizar um aborto, contudo se tornam prisioneiros de uma família de neonazistas canibais. Em primeiro ponto, o argumento parece simples, contudo, em meio a este aspecto central, existem várias histórias paralelas que funcionam em algumas partes (a rincha entre os familiares nazistas ajuda no clima de brutalidade) e prejudicam a fita em outras (o romancizinho entre os personagens centrais poderia ter sido evitado).

O filme é escrito e dirigido pelo francês Xavier Gens e acredito que é exatamente que residem todas as qualidades e, principalmente, os problemas do filme. Gens é um péssimo diretor de cenas de ação. Em alguns momentos o filme possui perseguição e tiroteio e chega a ser impressionante a falta de tato do diretor nestas cenas. Ele opta por vários cortes e uma câmera incessantemente trêmula que prejudicam demais a compreensão e o acompanhamento das cenas por parte do espectador. Por outro lado, em momentos mais calmos, ele consegue encaixar bons enquadramentos e dirige os atores de forma, no que é possível devido ao talento dos mesmos, até precisa.

Contudo, uma direção inconstante não é o ponto mais fraco do filme. Como eu já disse, o argumento é bom, o desenvolvimento é correto e o desfecho interessante, todavia a sensação de covardia do roteiro é inevitável. As cenas de tortura e de terror propriamente ditas são superficiais e passam a sensação de que Gens pretende eliminar um pouco o elemento explícito do filme para angariar um público não tão acostumado a tanta brutalidade. Com uma oportunidade dessas, Gens poderia ter ido muito mais além, e transformado A Fronteira em um filme muito mais visceral e poderoso algo que o diretor em questão optou por trocar por uma maior acessibilidade de sua obra.

Por mais que A Fronteira se mostre instável e covarde em alguns pontos, no final das contas o filme se sai bem e não coloca o espectador diante daquela sensação de tempo perdido. Eu confesso que esperava um pouco mais, contudo não chegou a ser decepcionante.


(Frontière(s) de Xavier Gens, França/Suíça - 2007)


NOTA: 6,5

segunda-feira, 4 de junho de 2012

JULGAMENTO EM NUREMBERG



Baseado nos julgamentos reais de colaboradores do nazismo ocorridos em Nuremberg na Alemanha poucos anos após o término da Segundo Guerra Mundial em 1945, este drama de tribunal do grande Stanley Kramer consegue com grandes méritos, não apenas reproduzir o clima dos tribunais de guerra, mas vai além e desenvolve válidos debates acerca de temas como a autonomia da nação sobre a lei, a soberania da mesma, a própria lei em si, além de adentrar em elementos complexos e que perpassam a humanidade até hoje; afinal apenas a Alemanha e seu povo são responsáveis por Hitler? Quanto o povo alemão sabia sobre as atrocidades praticadas pelo partido nacional-socialismo e o quanto devemos culpá-los de forma geral?

O roteiro do filme acerta em apenas apresentar as hipóteses acima colocadas, fazendo no máximo conjecturas acerca das mesmas nas figuras do advogado de defesa e da promotoria, contudo, nunca se verifica um como mais correto do que o outro, perpetrando com que tais questões apenas continuem pululando na mente das pessoas, levando-as às suas próprias decisões sobre o complexo e polêmico tema. Mesmo a decisão final em torno dos réus, não implica em uma tomada de posição, pois o roteiro e Kramer fazem questão de deixar bem claro que estamos diante de um julgamento de casuística e não de generalidade do nazismo na Alemanha.

Prato cheio para os estudantes de direito (os interessados e não essa patifaria que assombra os estudantes de direito atuais em sua maioria), os debates ocorridos ao longo dos quase 180 minutos de duração da fita são soberbos e cheios de passagens clássicas, além disso, Kramer é extremamente feliz no tempo dos diálogos e no modo como intercala momentos mais leves, de cafés e bebidas com os pesados momentos de debate e de oratória proveniente dos julgamentos.

Contudo a terceira haste do clássico tripé direção-roteiro-atuação também funciona muito bem, algo essencial em um filme fechado, que não possui nenhum outro elemento de impacto além do modo como o elenco assume as passagens e os insere em suas interpretações. Burt Lancaster incorpora de forma impressionante a culpa e tristeza do magistrado réu Ernst Janning. Judy Garland e Montgomery Clift e Judy Garland colaboram com o status de coadjuvantes de luxo. Maximilian Schell rouba a cena e enche a tela de emoção em seus discursos imponentes na defesa dos réus nazistas enquanto Spencer Tracy mostra novamente a união fina entre força e carisma em uma atuação que exige um tipo especial de talento que somente os grandes atores como Tracy possuem. Por mais que eu ainda prefira sua atuação em O Vento Será Tua Herança, colaboração anterior de Tracy com o diretor Kramer é impossível negar a grandeza da atuação do veterano ator.

Um grande filme e que consegue ecoar sua grandeza por vários âmbitos da especulação e do conhecimento, seja ele cinematográfico, histórico, ético ou do direito, isto para nos mantermos apenas nos mais explícitos. Muito mais que um filme de tribunal, a obra de Kramer é um clássico, exatamente por ter conseguido, sem se tornar ideológico ou partidário, elencar quase que de forma geral as complexidades de um processo histórico como o de Nuremberg. Nas mãos de alguém descuidado, um filme como este poderia se tornar um grande desastre; felizmente o homem da câmera era Kramer e este perigo não chegou nem a rondar os sets de filmagem.


(Judgement at Nuremberg de Stanley Kramer, EUA - 1961)



NOTA: 8,5

quarta-feira, 23 de maio de 2012

MÁRTIRES



Esforcei-me muito para encontrar este filme de grande fama entre os fãs de cinema de meios mais alternativos e obscuros. Todo este esforço, pensava eu, deveria ser recompensado com um grande filme de horror, algo difícil de imaginar quando verificamos que na verdade Mártires é uma produção francesa, o que por si só, e baseado na história do cinema deste país, parece caracterizar uma contradição embutida. Contudo, a verdade é que após os pouco mais de 90 minutos da fita, esquecemos a questão da nacionalidade e passamos a entender de forma bem clara o motivo de tanta fama e de tanta admiração, já que Mártires é um dos grandes momentos do cinema de horror dos anos 2000.

O cinema europeu nunca foi um grande produtor de filmes de terror (com exceção da Itália, claro), porém, com a grande crise do gênero dos EUA, os europeus resolveram se aventurar por este meio, e alguns conseguem grandes resultados como o espanhol [REC] e este filme aqui, que se utiliza de elementos de tortura e sadismo, porém sem aquele elemento de pura violência de filmes como O Alberque, Os Estranhos ou Violência Gratuita. Em Mártires, muito mais que o simples torturar por prazer, existe um conceito, uma ideia que é utilizada como pretexto e como defesa para tais torturas. Não entrarei em pormenores da discussão sobre a validade e a percepção da ideia que norteia tais procedimentos, pois de tal maneira poderia revelar detalhes do filme que chateariam pessoas com a intenção de assisti-lo, todavia posso afirmar que a ideia é interessante e muito bem colocada, mesmo que em alguns momentos se torne pouco explicada e em outros um pouco acelerada para dar lugar a cenas mais brutas e viscerais.

Mártires possui qualidades raras em filmes de terror. O elenco está muito bem, responde em igual qualidade tanto nas cenas de terror quanto nas cenas com exigência de maior dramaticidade. O arco argumentativo do filme é ótimo e muito bem trabalhado, assim como a intercalação entre passado e presente e as representações alucinógenas dos personagens. Além disso, a brutalidade do filme se dá com pouca escatologia e com muita precisão, utilizando-se muito pouco de elementos de cunho mais gore e focando-se em uma mistura muito bem dosada de terror psicológico e terror físico. O diretor Pascal Laugier consegue desenvolver o argumento de uma forma muito correta, e sua mão pesada é essencial para o clima de sofrimento e de dor constante que o filme tem necessidade de mostrar. Nas cenas finais, ou seja, momentos das revelações chaves da fita, o clima é extremamente perturbador, e a situação da torturada é arrepiante, porém o filme não perde o foco, e continua em sua linha de necessidade deste elemento para o cumprimento de seu objetivo. Muito mais que torturar o espectador, Pascal Laugier consegue impor reflexões sobre as obsessões humanas e os limites práticos de suas buscas. Muito mais que teoria, Mártires mostra o ser humano não se contentando a especulações metafísicas e teológicas e o revela em tentativas práticas de elementos especulativos em sua essência.

Se Mártires possui um defeito, este com certeza é seu trabalho de maquiagem, que em alguns momentos se mostra extremamente falho, tirando toda e qualquer realidade da cena, e a transformando em algo incomodamente superficial, entretanto, optei por ignorar tal aspecto, por se tratar de um filme independente, de baixo orçamento, e que possui preocupações (sendo estas bem desenvolvidas) muito maiores e mais importantes.

Mártires não foi lançado no Brasil, o que dificulta o acesso dos fãs locais ao mesmo, contudo o remake americano (é claro que isto iria acontecer) deve aparecer por aqui para deturpar a obra original e torná-la bem menos potente e interessante, de tal forma, que fica aqui a minha dica: antes de ser infectado pela versão estadunidense, procure na internet ou com colecionadores a versão original e se surpreenda com um grande filme, que consegue superar os sustos baratos e as histórias estúpidas que normalmente caracterizam os filmes do gênero atualmente. Imperdível.


(Martyrs de Pascal Laugier, Canadá/França - 2008)



NOTA: 9,0