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sábado, 30 de julho de 2011

ASSALTO AO BANCO CENTRAL



O cinema brasileiro começou a consolidar um tipo de linguagem que tem potencial para conquistar espaço e público frente às obras hollywoodianas. A fórmula encontrada: personagens carismáticos, uma montagem dinâmica, diálogos marcantes e uma história baseada em fatos verídicos. Os cineastas têm mostrado criatividade em romantizar enredos que respiram em casos da vida real, vide os recentes Tropa de Elite, Bruna Surfistinha, Jean Charles e Chico Xavier. Assalto ao Banco Central é mais um exemplo dessa leva. O filme conta a história do maior assalto a banco da história do Brasil, mas bebe muito na fonte de um formato já consagrado nos EUA. Lembra alguns filmes muito divertidos como Onze Homens e Um Segredo e Os Vigaristas, por exemplo.

Assalto ao Banco Central ganha o espectador por dois principais motivos: o carisma dos personagens e o desenvolvimento interessante da história. Foi feita uma opção de quebrar a linearidade. O diretor optou por intercalar em sua narrativa o desenrolar do plano para realizar o assalto e os desdobramentos do crime, que resultou na prisão de quase todos os envolvidos. É verdade que algumas atuações são irregulares e que a montagem comete muitos erros no desfragmento da história. Algumas vezes o filme insiste em uma informação desnecessária porque já sabemos o que aconteceu adiante. Outras vezes, faltam parâmetros ao se referir a algo que ainda estava para ser mostrado.

Mas o roteiro consegue criar situações inusitadas. Os personagens entram em situações impagáveis que levam a boas risadas. E o filme tem um ritmo constante, nunca deixando o nível de interesse do espectador cair ao longo da projeção.

Há, é claro, muitos problemas técnicos. Mas que podem ser perdoados. Percebe-se uma influência televisiva que é sempre muito nociva para o cinema brasileiro. E não é só no elenco. É na fotografia, nos enquadramentos e na trilha sonora. Isso dá aquela sensação de estar vendo novela das nove em versão ampliada.


Mas quem conseguir relevar e estiver procurando por uma hora e meia de entretenimento, em um filme que de fato consegue se aproximar muito da realidade do próprio espectador, pode ter em Assalto ao Banco Central uma boa experiência cinematográfica, sem ter que recorrer aos figurões americanos.



(Assalto ao Banco Central, de Marcos Paulo. 2011)



NOTA: 7,0

domingo, 24 de julho de 2011

MEU PRIMEIRO AMOR

 

Não é segredo nenhum, que Meu Primeiro Amor é um daqueles filmes que atualmente fazem parte de um panteão de obras carinhosamente chamadas pelos fãs de “clássicos da Sessão da Tarde”. Também não é segredo nenhum que Meu Primeiro Amor está na lista de favoritos de várias pessoas, principalmente daqueles que cresceram acompanhando e se emocionando com a história de Vada e de Thomas J. Agora, vinte anos depois, o que restou desta obra outrora tão significativa e tão amada? E a resposta, para a alegria de muitos, é que Meu Primeiro Amor alcançou um status que poucas pessoas, ou até mesmo nenhuma, chegou um dia a imaginar, o filme se tornou um clássico, e é ainda hoje insuperável quando o assunto são as descobertas e o despertar sentimental das crianças, seja para sentimentos de alegria ou para sentimentos de tristeza.

O grande trunfo de Meu Primeiro Amor é a sutileza, e a capacidade de ter conseguido se livrar de jargões e preceitos pré-concebidos envolvendo esta fase tão complicada da vida das crianças. O filme não tenta um relato objetivo da questão, mas sim subjetivo, tanto que a maior parte do filme se passa no casal central de protagonistas, e mesmo quando se desvia para outros personagens, estes continuam sob o atento olhar dos anteriores. Dan Aykroyd e Jamie Lee Curtis, possuem o mérito de perceber que o filme é doa atores mirins e em nenhum momento tentar subverter ou inverter para seu próprio lado tal situação; sendo que isto colabora demais para o resultado final.

A direção de Howard Zieff é precisa e acerta demais em criar uma vivacidade muito bonita ao acompanhar de várias maneiras o casal de protagonistas. Em alguns momentos a câmera está longe, de repente ela está frente a frente com os dois, em um meio termo, tudo dependendo da intensidade e da necessidade da cena para o enredo geral. A cena do primeiro beijo de Vada e Thomas J. jamais se tornaria inesquecível do jeito que se tornou se não fosse pelo perfeito enquadramento de Zieff. O roteiro é uma beleza a parte. Cheio de situações e diálogos emocionantes, divertidos e bem encaixados, possui o mérito de tratar um assunto complexo de forma tão cativante e sem cair em erotismos implícitos e em situações apelativas e desnecessárias.

Agora, tudo isto nada mais é que o corpo do filme, pois a alma, a essência, o coração do negócio está na dupla mirim Anna Chlumsky e Macaulay Culkin. Sem eles e suas ótimas interpretações, Meu Primeiro Amor não seria nem de perto o que é hoje. É impressionante como dois atores tão jovens podem possuir tanta química e se unirem tão bem. Ao mesmo tempo em que passam pelos mesmos problemas, representam um antagonismo muito forte. Ela, pela convivência fina com a morte (seu pai é dono de funerária), possui uma visão menos “reprimida” das coisas (pelo menos em teoria) e se solta mais, enquanto ele se mostra uma clássica criança mimada pelos pais, com horários para tudo, até pelo fato de se tratar de um menino “alérgico a tudo”. De modo bem sutil, é como se ela procurasse ser o que ele é; enquanto ele procura ser como ela. Em particular, eu prefiro o personagem de Culkin, que é muito mais preciso e se encorpa melhor, contudo os dois formam fácil, um dos mais marcantes casais dos últimos vinte anos de todo o cinema. Todavia, o grande antagonismo representado pelos dois está no par conceitual amor/morte. Vada só percebe o que sente por Thomas J. após perdê-lo, enquanto que Thomas J., indiretamente, perde sua vida por um capricho de Vada. A descoberta do amor é mais difícil de perceber do que a dor de perdê-lo, e talvez seja por isso que a maioria das pessoas precisam perder um amor, para realmente taxá-lo como tal. Esta ideia é tão banal hoje, que soa até boba no modo como eu a represento, mas talvez tenha sido exatamente esta ideia que perpetuou este filme, já que quando Vada desejou dizer a Thomas J. que ele era seu melhor amigo, já era tarde demais. O par conceitual se funde na figura de Vada, a partir do momento em Thomas J. morre, tornando-se o ápice, pois pela primeira vez, os dois sentimentos se mostram tão fortes nela mesma, algo que anteriormente ela só havia presenciado de forma distante e separada.

Pode até parecer uma busca por “chifre em cabeça de cavalo”, mas Meu Primeiro Amor possui alguns pequenos problemas. A reconstrução dos anos 70 poderia ter sido mais caprichada, e em alguns momentos, o filme busca uma “psicologização” do embate primeiro amor/primeira perda que soa forçado e até mesmo piegas, como pode ser visto na cena entre Aykroyd e Lee Curtis no início do funeral de Thomas J.

Os anos 90 ficaram para trás, Chlumsky e Culkin jamais se tornaram os astros que poderiam ter sido (cada qual por seu motivo), e ficou então uma sensação de coisa única, de uma combinação que não se repetirá mais. Como eu já disse antes, em seu gênero, Meu Primeiro Amor ainda é o que existe de melhor, e não deixa de ser ainda hoje um grande passatempo e uma grande experiência, além de ter se tornado um dos raros casos onde um filme antes cult “subiu” de categoria e se tornou um verdadeiro clássico.


(My Girl de Howard Zieff, EUA - 1991)


NOTA: 9,0

segunda-feira, 18 de julho de 2011

HARRY POTTER E AS RELÍQUIAS DA MORTE PT. II


Sem dúvida alguma, ontem, em uma tarde calorosa de domingo, estava eu à frente do filme mais esperado do ano. Por fãs pelo simples fato de serem fãs, pelos não-fãs, por terem mais uma oportunidade de criticarem a série, e pelos curiosos (como eu), que simplesmente tinham vontade de ver o final desta história que se tornou fenômeno no mundo todo.

Concordando ou não, o fato é que a saga Harry Potter é um dos maiores fenômenos da história do cinema, mesmo quando verificamos muito mais o âmbito do apelo popular do que propriamente da inovação ou da contribuição técnica para o desenvolvimento da sétima arte. Contudo, faltava a cereja no topo do bolo. Ao que tudo indicava, e eu acreditava nisso, a saga do bruxinho deixaria o palco cinematográfico sem sequer ter produzido um grande filme, desconfiança que aumentou após a problemática primeira parte de As Relíquias da Morte. Entretanto para a alegria de todos, incluindo a minha, e para desespero dos críticos mais “cegos” da saga, eles conseguiram: se faltava um grande filme para colocar de vez a odisséia de Harry Potter entre as grandes sagas da história do cinema, aos 45 do segundo tempo o gol saiu. Harry Potter e As Relíquias da Morte Pt. II é, de longe, o melhor filme entre os oito anteriormente produzidos.

Poucas vezes eu vi um filme de aventura e fantasia com um ritmo tão alucinante. Yates consegue um ritmo tão frenético e ao mesmo tempo tão sensato (algo muito difícil de fazer), que a atenção do espectador não se desvia da tela um minuto. Minha única crítica a direção e talvez ao próprio filme, é o fato de que o diretor não consegue sequenciar muito. Com isto eu quero dizer que, eu não gosto do modo como Yates em alguns momentos está acompanhando uma cena, e ao invés de continuar no mesmo plano, ele corta e às vezes fica quase que na mesma tomada, isso prejudica um pouco o andamento da coisa, todavia admito também, que tal observação é muito mais um capricho e uma preferência minha do que uma falha propriamente dita. Acho necessário voltar a frisar que quem escreve aqui é um espectador não fã, já que ao contrário de As Relíquias da Morte Pt. I, esse novo filme funciona e muito bem, para qualquer espectador, e o livro não é mais necessário para uma compreensão precisa da fita. Não há cenas desnecessárias e muito menos aquela sensação de que o filme está se arrastando única e exclusivamente para gerar corpo para acoplar minutagem.

O roteiro é bem enxuto e consegue sempre se fixar naquilo que realmente importa, não há desvios ou peças deslocadas. Yates consegue amarrar todos os nós que vinham se desenvolvendo ao longo dos outros sete filmes, e faz isso com uma precisão milimétrica. Eu não li todos os livros (estou terminando o terceiro), porém vi todos os filmes e mais de uma vez, e não consigo me lembrar de nenhum aspecto que ficou mal amarrado ou que tenha sido necessária uma hipótese ad hoc (considerando-se aqui a inclusão de novas, pois a saga em si, utiliza-se de muitas), em outras palavras, a saga foi realmente finalizada e em todas as suas nuances.

O elenco merece atenção especial, tanto o trio de protagonistas e principalmente os “coadjuvantes”. O filme resgatou vários personagens e proporcionou aos respectivos atores oportunidade para se divertirem e melhorarem a qualidade de suas interpretações em relação aos últimos filmes. Julie Waters como a mão dos Weasley e Maggie Smith como a Profa. Minerva possuem cenas sensacionais, isso para ficar em apenas dois exemplos. Alan Rickman sempre foi um destaque com sua peculiar interpretação do misterioso Severo Snape, porém sua melhor atuação no personagem foi quando este último revelou seus mistérios, fazendo com que aqui encontremos sua melhor colaboração com a saga. Fenômeno parecido ocorre com Ralph Fiennes que constrói um Voldemort sensacional e com uma garra não vista nos filmes anteriores. Assim como Rickman, Fiennes também nos proporciona aqui sua melhor atuação como Voldemort.

O trio principal evoluiu muito ao longo dos anos, logicamente que isto não os transforma em grandes atores, porém é possível que algo bom surja dali (puro achismo). Radcliffe finalmente vive Harry Potter ao invés de simplesmente atuar, e consegue se relacionar muito bem tanto com o espectador como com os outros atores do elenco. Em um efeito meio Denzel Washington/Robert Downey Junior, Radcliffe se transforma aqui em um ator espaçoso e que ocupa as cenas com muita força. Vale ressalva que esta é uma característica do personagem e não do ator, e isso era sempre um problema nos filmes anteriores, pois Radcliffe não conseguia ocupar os espaços que o personagem por si só precisava ocupar, algo que “antes tarde do que nunca” acontece aqui. Ponto para o jovem ator, que assim como os dois veteranos acima citados, empresta a este último capítulo sua melhor atuação, só que neste caso, estamos diante da melhor de sua até o momento curta carreira. No final das contas, me parece que todo o elenco sentiu que tudo terminava ali, e que eles precisavam deixar uma boa impressão, fato que fez com que todos palpitassem com o filme como nunca havia acontecido antes.

A parte técnica que sempre foi impecável, não perderia a mão aqui para estragar tudo. Efeitos especiais precisos, uma fotografia com tons sombrios que se mostra muito engenhosa e condizente com o clima do filme, além da já conhecida e ótima trilha sonora e de uma edição de som de arrepiar em alguns momentos (os sussurros de Voldemort são simplesmente assombrosos); ou seja, tudo nos conformes.

Chega então ao fim uma saga que merecia um filme como este. Uma saga que viu grandes atores como parte dela, em participações pequenas (Kenneth Branagh, Jim Broadbent, Richard Harris, Gary Oldman entre outros citados ou não neste texto) ou mesmo acompanhando toda a saga (Robbie Coltrane, Jason Isaacs, Fiona Shaw e outros citados ou não neste texto), uma saga pela qual passaram quatro diretores diferentes e que passou por altos e baixos. Harry Potter e As Relíquias da Morte Pt. II se une ao quarto filme e ao sexto como os meus favoritos (o segundo também), com o lembrete de que aqui estamos falando de um filme com um algo mais, um algo mais que pode ter vindo de vários lugares, e que encontra sua importância em um resultado final que superou todas as minhas expectativas. A saga Harry Potter terminou, porém se manterá viva, sendo vista e revista ao longo de muitos anos, por fãs, não-fãs e curiosos, ou seja, por todo tipo de amante de cinema. Parabéns aos envolvidos e aos fãs também, já que nunca desistiram da saga, e a recompensa veio, mesmo que, como dito antes, aos 45 do segundo tempo, mas qualquer adepto do futebol sabe que mesmo nos acréscimos, se estiver dentro das regras o gol é legal, e ganha o jogo.


(Harry Potter and the Deathly Hallows Pt. II de David Yates, EUA - 2011)
 
 
 
NOTA: 9,0

quarta-feira, 13 de julho de 2011

SEMPRE AO SEU LADO


Sempre fui um tecnicista quando o assunto é arte. Admito a idéia de que a arte necessita de elementos emotivos para funcionar, contudo não comungo de um ideal punk/anárquico da arte de que qualquer um pode fazer arte, ou que qualquer coisa desde que seja a expressão de alguém seja arte. A arte, seja ela qual for, possui uma técnica base, que precisa ser seguida para ser considerada tal arte. O que me torna um tecnicista convicto é o fato de que defendo uma idéia bem definida. Uma obra de arte tecnicamente perfeita desperta um sentimento de admiração tão grande por sua perfeição que não precisa possuir emoção em si mesma, enquanto que uma obra que transborde sentimento não consegue escapar das amarras e da necessidade de uma técnica básica. De tal modo que, um filme (já que o assunto aqui é um filme) perfeito é aquele que tem uma técnica extremamente apurada que cause uma sensação no espectador pela sua perfeição e Cidadão Kane é um ótimo exemplo disso, ou ainda um filme em que a técnica básica seja cumprida com eficiência, sem brilho, mas sem prejudicar também e que o caráter emotivo que desperta eleve o espectador ao êxtase que deveria ser provocado pela perfeição técnica que se substituiu pela eficiência e como exemplo disso, cito o atual Não Me Abandone Jamais. Julgo então que a técnica básica do cinema é o clássico tripé roteiro/atuação/direção e que um filme que não falhe nestes três pode alcançar a perfeição mesmo falhando em outros não básicos como efeitos especiais, figurino e afins, desde que o emocional segure a barra. Em resumo, um filme possui uma parte técnica e uma emocional, sendo que a primeira em seu auge desperta a segunda, mas a segunda não consegue esconder as falhas da primeira e eu nunca encontrei uma e exceção até hoje, contudo se existe um filme que quase me fez derrubar tudo o que acredito desde que me tornei um cinéfilo foi este drama aqui tratado. Tudo isto se deve ao fato de que, eu nunca vi um filme que conseguisse captar e emocionar tanto o espectador que quase não deixa margens para adentrarmos em seus problemas, na verdade você só consegue analisar friamente o filme depois que o mesmo termina, ou quando você o revê já livre do impacto da primeira vez.

Sempre Ao Seu Lado é dirigido pelo sueco Lasse Hallström e conta a história baseada em fatos reais de um cão que todos os dias levava e buscava o seu dono para a estação de trem para este trabalhar e depois voltar para a casa. Um dia fatídico dia, seu dono morre no trabalho e consequentemente jamais retorna. Hachiko (esse é o nome do cão) então passa nove anos de sua vida retornando todos os dias ao local para esperar pelo seu dono, e só parou porque morreu. Qualquer pessoa que conhece a carreira do sueco Hallström sabe que uma de suas principais características é a mão pesada para dramatizar as coisas, elemento que em alguns momentos prejudicou sua carreira, mas que em outros se mostrou extremamente eficaz, e Sempre Ao Seu Lado se encaixa neste segundo grupo.

Aqui tudo é banhado de emoção, o negócio do filme é fazer o espectador cair nas lágrimas, e venhamos e convenhamos, consegue isto como poucos. O ser humano cada vez mais, é carente de sentimentos verdadeiros e despretensiosos, o que faz com que uma história onde isso é tão presente, gere uma sensação de vazio e de esperança absurdamente grande. Eu não conheci ninguém até hoje, que viu este filme e não se emocionou, ou seja, o objetivo de Hallström foi cumprido com louvor.

Outra escolha acertada foi Richard Gere. O ator vive a situação e se deixa levar pelo cão, que é sem sombra de dúvida o dono do filme. Aceitar ser um coadjuvante tão submisso assim, só poderia vir de alguém que acredita naquilo que o filme propõe que gosta de uma relação como a proposta aqui. Gere é um público amante e defensor dos animais e eu acredito que isto foi vital para a relação que se criou entre ele e o cão soar tão bela e tão natural. Joan Allen que é sempre uma boa escolha também aparece bem como a esposa de Gere.

Contudo, algumas ressalvas devem ser feitas. O elenco de coadjuvantes, com poucas exceções, não ferve como o restante do filme, criando um abismo entre as cenas centrais e as complementares do roteiro, o que cria uma flutuação de ritmo que em alguns momentos não se justifica. Além disso, a já citada mão pesada de Hallström perde a oportunidade de, em alguns momentos, dar uma folga e criar situações mais leves e que façam o espectador não passar uma tristeza tão grande em todos os momentos.Todavia, como disse no primeiro parágrafo, você se envolve tanto com o filme, que estes problemas só aparecem depois, e ainda com muito esforço, ou seja, o tripé básico de Sempre Ao Seu Lado não é tão eficiente em suas bordas, mas isso é quase imperceptível devido à incrível carga emocional da fita.

Aqui é tristeza mesmo e não uma ideia de cunho realista-depressiva como nos filmes de Ken Loach ou aquele trágico clássico dos filmes escandinavos e principalmente dos dramas de Ingmar Bergman, ou ainda o sentimentalismo maniqueu que aparece na maioria dos filmes de Jim Sheridan. Após a morte do personagem de Gere, o filme leva o espectador a uma comoção e a uma tristeza tão grande que em alguns momentos você pensa em desistir de assisti-lo tamanha força destes sentimentos.

Sempre Ao Seu Lado se mostra um filme muito bonito, muito eficiente e consegue mexer com o espectador de uma forma, sem exageros, avassaladora. Não tem cacife para clássico, mas algo me diz que o caminho para se tornar cult, já está bem delineado, ou melhor, esta obra de Hallström já nasceu cult e é com este rótulo, ao que tudo indica que se manterá na história do cinema, rótulo que, diga-se de passagem é mais do que merecido.


(Hachiko: A Dog´s Story de Lasse Hallström, EUA - 2009)



NOTA: 8,5

quarta-feira, 6 de julho de 2011

ALÉM DA VIDA


Não é de hoje, que uma das especialidades de Clint Eastwood se mostrou ser a capacidade que o mesmo possui de transformar em algo simples, direto e acessível temas complexos e que muitas vezes são vistos como tabus pelas sociedades em geral. Em seus filmes mais “atuais”, Eastwood já tratou de pedofilia, preconceitos de vários tipos, eutanásia, corrupção, isso para citar apenas os mais explícitos, e o que se viu em todos estes casos foi um diretor muito coeso e que consegue arrancar de fórmulas batidas elementos no mínimo consistentes, e talvez seja isso que faz com que o veterano ator/diretor seja um dos nomes mais respeitados do meio.

Em Além da Vida, Eastwood novamente aposta na dicotomia tema complexo/execução simples para criar um filme simples, simbólico, poético, eficiente e muito bonito. Acompanhamos aqui três histórias que correm paralelas ao longo de quase todo o filme e que convergem no final, no melhor estilo Altman/Kieslowski. A primeira delas acompanha uma jornalista francesa que é vítima do tsunami que atingiu o sudeste asiático em 2004 e que devido a isso passa pela chamada “experiência de quase morte”, situação que altera toda a sua vida posterior. A segunda história acompanha um médium (pessoa que fala com os mortos, e que fala de verdade, sem picaretagem), que encara seu dom como uma maldição e que pretende se livrar de tal para viver uma vida normal. A terceira história acompanha um menino que perdeu em um acidente seu irmão gêmeo de quem era muito companheiro e que busca alguma ajuda para tentar contatar este irmão que sempre o ajudou.

A partir destas três histórias Eastwood pretende realizar uma análise profunda e concisa sobre uma das maiores questões da humanidade: O que acontece quando morremos? Esta questão é embargada por vários tipos de ecos, entre eles filosóficos, morais e principalmente religiosos, e é aqui que talvez encontremos o maior deslize do filme, que é o fato de o mesmo, de modo bem sutil, tomar um partido. O filme parte do pressuposto de que existe uma vida após a morte, ou algo após a morte, e em nenhum momento coloca qualquer possibilidade de inexistência de tal situação, em um movimento de crença um pouco complicado em aceitação para quem não possui tal crença. No momento em que o filme se deparar com alguém que não crê em uma vida após a morte, se este não comprar a idéia, pelo menos enquanto o filme se encontra em sua frente, tudo aquilo parecerá bobo e sem sentido.

Agora a pergunta que fica é: Se o filme não ignora sua crença, porque o espectador deveria? Não entrarei em questões pessoais e admito que tecnicamente e artisticamente o filme é muito bem construído, porém seu roteiro deveria ter tomado um pouco mais de cuidado com tal situação. A verdade é que Eastwood apostou na maioria, pois todos sabemos que a população crente em uma vida pós vida é muito amor que os negadores de tal entidade. Outro aspecto é que dentro destes crentes existem muitas variações, porém aqui, o filme acerta. Ao colocar várias modificações e alterações dos personagens quanto às suas situações, de certo a fita navega por várias crenças, o que, se não acerta em cheio toda pelo menos trabalha um pouquinho em cada modelo.

Aspectos argumentativos deixados de lado (pois o tema é interessante e pode gerar uma discussão muito longa), passemos a uma análise mais cinematográfica por assim dizer. Com a câmera na mão Eastwood é realmente um dos melhores. A ligação e a conexão que o mesmo consegue com seus personagens são intensas, e o modo como ele consegue se livrar das parafernálias que um filme que retrata em alguns momentos planos alternativos poderia gerar. Não há nada apelativo, e a simplicidade e objetividade de Eastwood realmente colabora para criar um clima muito interessante, além de conseguir fazer Além da Vida em nenhum momento descambar para um filme de fantasmas e de criações mirabolantes. O elenco é eficiente e encontra um Matt Damon cada vez melhor e cada vez mais a vontade na mão de Eastwood com que já havia trabalhado em Invictus. A fotografia é belíssima e a reconstrução do tsunami é uma daquelas cenas extremamente marcantes e de impecável realização.

Além da Vida pode não ter a força de Sobre Meninos e Lobos e nem o brilhantismo de Gran Torino, mas talvez seja, o mais clássico e plástico dos filmes de Eastwood. Direto e simples, o diretor consegue novamente se sair bem do tratamento de um assunto polêmico, por mais que, em alguns aspectos seu roteiro tenha falhas e exija do espectador uma “boa fé” que o próprio filme em si não possui para superar tais falhas. Agora, devo admitir que esta “boa fé” vale a pena, eu a tive e não me arrependo não, até por que no final das contas, assisti a um ótimo filme, tive boas experiências com o mesmo e minhas considerações sobre o tema continuam as mesmas de antes.


(Hereafter de Clint Eastwood, EUA - 2010)



NOTA: 7,5

terça-feira, 5 de julho de 2011

EM NOME DO REI


Quando comecei a assistir Em Nome do Rei já tinha em minha mente que se tratava de um filme que havia concorrido ao Framboesa de Ouro de pior filme, além de ter recebido críticas pesadíssimas dos críticos e ter gerado uma ira nos fãs ortodoxos do game no qual o filme foi baseado, que atende pelo nome de Dungeon Siege e que eu não sei nem se tem nome em português e também não tenho a menor idéia como é este jogo.

Fica claro então que eu não faço parte dos fãs cruéis que massacraram Em Nome do Rei por não representar bem o jogo, porém eu faço parte daqueles que entendem as críticas pesadas e também a indicação ao Framboesa de Ouro. É lógico que eu já vi coisa pior, inclusive outro filme do diretor Uwe Boll, no caso o terrível Alone In The Dark, agora o filme foi cercado de expectativa, e um dos grandes pontos a favor de um filme para este concorrer ao Framboesa de Ouro é a decepção que causa, muito mais até que a baixa qualidade.

Em Nome do Rei tem tantos problemas, que se eu resolvesse detalhar todos, tenho certeza que me alongaria excessivamente para um texto que fará parte de um blog, assim sendo, me aterei àquelas que considero mais fortes e mais imperdoáveis. Começo pela análise da direção do alemão Uwe Boll, que, de diretor não tem nada. É impressionante como Boll não consegue criar profundidade em nenhuma cena. Tudo é muito corrido, a câmera parece pendurada em algum lugar enquanto os atores pulam na sua frente. Ele erra nos enquadramentos e não consegue sequer criar o clima necessário para o decorrer do que se propõe. Para resumir em poucas palavras, ou melhor, em uma, lastimável, já que nem quando ele tem a chance de se utilizar dos planos abertos que encaixariam melhor as batalhas e esconderiam um pouco à falta de criatividade do diretor o resultado é diferente, o que me leva a perguntar como um cara desses consegue emprego no cinema?

O elenco, recheado de nomes conhecidos, porém poucos confiáveis demonstram o porquê de tal condição. Jason Statham até briga bem, mas querer que ele demonstre emoção é querer demais, simplesmente não dá. Leelee Sobieski parece uma pedra andando e não consegue desenvolver uma personagem que no final das contas não possui função nenhuma. Burt Reynolds não se livra em nenhum momento de sua cara de canastrão o que faz com que seu “rei justo e bondoso” pareça até uma piada. Agora, nada se compara as atuações irritantes e cruéis dos vilões do filme. Ray Liotta e Matthew Lillard nos proporcionam interpretações que beiram o amadorismo. Para não jogar tudo no lixo quanto às atuações, John Rhys-Davies, Will Sanderson e Claire Forlani até se esforçam, mas esbarram em personagens mal utilizados e mal construídos pelo roteiro, se é que se pode chamar uma história tão bobinha, tão clichê e tão sem imaginação de roteiro. Previsível, cheio de buracos e de saídas fáceis, o argumento do filme se transforma em uma união de tentativas de cenas de ação mal feitas, com dramas e aventuras medievais misturadas a elementos de fantasia, com direito a monstros e magia agregados ao mesmo.

Como se não bastasse, os efeitos especiais do filme são péssimos e a edição de som usa e abusa de tilintes e de “sons da natureza”, insistindo nestes, mesmo quando uma música se faria mais precisa. Aliás, se podemos salvar algo desta baderna cinematográfica, este algo é a trilha sonora, e com um ou outro deslize, o figurino também não faz feito, mas venhamos e convenhamos que é muito pouco, para um filme que possuía pretensões não muito modestas, ainda mais por estar incluído na turma das adaptações de um dos elementos mais fortes e de fãs mais radicais que existem, no caso, os fãs de vídeo games.

Tenho certeza que para os fãs do jogo citado em nosso primeiro parágrafo a decepção foi grande, e também tenho certeza que estes fãs torcem para Boll não resolver “adaptar” outro jogo para o cinema, eu pelo menos torceria, pois, se Alone In The Dark já era um filme de qualidade muitíssimo questionável (sendo bonzinho), Em Nome do Rei segue uma linha bem parecida, por mais que seja “menos pior” que o citado antecessor. Nem mesmo a boa Skalds and Shadows da banda alemã Blind Guardian tocando no menu e nos créditos salva isto aqui.



(In The Name Of The King: A Dungeon Siege Tale de Uwe Boll, Alemanha/Canadá/EUA - 2007) 



NOTA: 3,0