Um dos grandes clássicos do terror e do suspense de todos os tempos, Os Inocentes é uma obra de peculiaridades claras, que consegue como poucos filmes dosar tensão e sustos, sem perder seu elemento clássico, além de conseguir fazer tudo isso sem descambar para maneirismos ou situações absurdas que poderiam ser utilizadas (e neste tipo de filme muitas vezes são) para amarrar e resolver o enredo de forma mais rápida, porém normalmente mais falha.
Os Inocentes conta a história de uma governanta recém-contratada para cuidar de duas crianças na casa de campo onde elas vivem. A partir de tal ponto, a governanta começa a perceber eventos estranhos na casa, o que a faz, muito mais que colocar em cheque a sobrenaturalidade destes fatos, começar a questionar a aparência e as atitudes angelicais e dóceis das crianças.
Os Inocentes é um filme único, pelo fato de trilhar por caminhos muito diferentes do que a maioria das fitas de seu gênero. A personagem de Deborah Kerr, ou seja, a governanta, ao começar perceber a presença de fenômenos sobrenaturais na casa, não apela para resoluções mirabolantes ou correrias desenfreadas para que de repente uma pista salte à sua frente para lhe criar uma visão epifânica. Por mais que elementos deste tipo até se apresentem, eles acontecem em uma escala tão baixa e tão coadjuvante que nem fixam raízes, dando espaço para uma resolução mais centrada, mais pautada nas desconfianças da personagem do que propriamente em pudores ou moralismos. Colocar as crianças como elementos de presença dos fantasmas, e associá-los a maldade é algo pouco visto atualmente, muito devido ao elemento hipócrita politicamente correto de nossa sociedade atual. Aqui a coisa é diferente, e a governanta não desvia suas desconfianças das crianças e as associa a maldade sem qualquer tipo de freio ou ficcionismo.
Falando do filme em si, Os Inocentes não tem estrutura de terror/ação, mas sim de terror/drama, ou seja, não possui aquele clima desenfreado onde sustos pululam de todos os lugares sem qualquer compostura, mas sim aquele clima mais ameno, onde o suspense e o terror vão se desenvolvendo com o tempo para alcançar seu clímax a longo prazo. O resultado disto é um filme que em seu início é bem tranqüilo, mas que após algum tempo gera uma tensão no espectador que ultrapassa a existência de sustos. Filmes onde os sustos são mais dispersos ao longo do roteiro funcionam melhor, pois o espectador não sabe muito bem onde e quando eles acontecerão. A tensão é tão grande que você termina o filme meio perdido, efeito que ainda se alonga por algum tempo após o término da fita. Tal ressalva feita, que fique claro outro aspecto: com os poucos sustos que o filme tem, ele consegue simplesmente gelar a espinha do espectador (poucas vezes passei tanto pavor na frente de um filme quanto na cena em que o menino Miles está de costas para uma janela e um vulto aparece atrás da mesma dando risadas).
A direção é precisa, o elenco é ótimo e a direção de arte brilhante, unida a uma fotografia estupenda, onde as sombras são utilizadas de maneira assombrosa (com o perdão do trocadilho) para ajudar na criação do penumbroso clima que percorre toda a fita. A lamentar, apenas a dificuldade de acesso ao filme atualmente. Fora de catálogo no Brasil há bastante tempo, depende-se de boas almas que disponibilizem o filme, elemento que o encarece bastante, justamente, diga-se de passagem devido a seu caráter de raridade. Devido a isso, por exemplo, levei um bom tempo para ter acesso a esta grande obra.
Lamentos deixados de lado, Os Inocentes é com certeza um filme que deve ser visto por qualquer fã de cinema, independente de peculiaridades genéricas de gosto, pois o filme é muito mais que um mero suspense ou filme de horror, é uma grande obra feita pelo cinema, que potencializa características e técnicas que ultrapassam as limitações de seu gênero. Imperdível.
(The Innocents de Jack Clayton, Inglaterra - 1961)
NOTA: 9,0
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